Bongrado e sua infinita banda de um homem só

Bongrado e sua infinita banda de um homem só

Em época de integração digital e coletividade ensaiada, aquelas parcerias todas que formam os projetos musicais, Guilherme Cysne se mostra a contramão do tempo. O capixaba entrega sua mais recente obra, composta, inteiramente, por ele mesmo. A ajuda externa é paralela, mas só faz papel de coadjuvante. O EP Nômade, material solo de estreia do artista, é de sua banda: Bongrado. Exército de um homem só, como ele mesmo intitula essa aventura.

“Lance Astral” abre o EP. De uma precisão instantânea, é como se os astros se alinhassem nos primeiros acordes. É difícil assimilar a complexidade de instrumentos e harmonia conduzidos por uma pessoa. Pois Cysne, que coleciona projetos com outras bandas e artistas há 15 anos, é capaz.

“Teve torcida gritando quando a luz voltou” é pedaço de calmaria. Música perfeita pra se escutar dentro de um carro, fora da casa. Algo que saia de paredes, pelo menos pelo tempo de três minutos. Quando a luz acabou, a cidade deum um “click”, sem entender exatamente o seu papel. É Guilherme quem conta o que acontece depois.

Pelo cuidado desde a criação, composição, melodia e instrumentalização, Nômade surpreende com a suavidade do conjunto. “Tereza”, terceira faixa, acelera novamente o ritmo sem perder a consistência das letras. A história da mulher vai se confundindo com outras, tamanha identificação. “Coisa de novela” mistura – sorrateiramente – rock e bolero, sem sair da mesma casa que abriga as outras canções. Guilherme Cysne gravou as músicas em seu próprio quarto. Para quem escuta sem conhecer os detalhes da produção, é fácil imaginar um estúdio profissional e pelo menos dez pessoas, contando músicos e produção.

Os ritmos leves de “O sentido da vida é pra frente” vão fechando o conjunto, que termina com “Rotina”. Músicas de intensidade, que contam a história que poderia ser minha e sua ao mesmo tempo. A sensação se adequa ao vazio de um excelente livro recém terminado, a um filme com créditos subindo, a qualquer momento de felicidade que chega ao fim.

O que torna tudo mais fácil é que o botão de play não sairá do lugar e é certo que será reutilizado. Cysne consegue colocar em prática o que muitos ainda têm medo. Já dizia Guimarães e sua Rosa: “O que ela (a vida) quer da gente é coragem”. Esse artista – por si só completo – vê, entende e transcreve o mundo, e por isso, detém importância.

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Mariana é de gêmeos, capixaba e jornalista, não necessariamente nessa ordem. Está em dúvida se gosta mais de ler ou de escrever. Espero que nunca descubra.

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