Hugo Dos Santos afirma que “Longe é aqui”, concordo.

Instrumentos a postos, últimos ajustes em aparelhos, e Hugo já me pede para achar colírio pro olho do mundo. Sotaque deliciosamente feito (e inteiro) de nordeste, jogadas de mão em guitarra, figura na contra luz cantando, ritmados. O ambiente escurecido do estúdio começa a ganhar forma e cor assim que se inicia o clipe. Meus ouvidos se afeiçoam ainda mais com essas sintonias pulsantes que a banda vai entregando, aos poucos.

A música “Longe é aqui”, já remete essas desconstruções interessantes. Hugo continua e pede um bom calmante para as ondas do mar. Será possível então? Acalmar onda brava, ressaca de maré? Curar o olho do mundo. Ou melhor, o que seria essa vermelhidão do olho que tudo vê? Por que o longe é aqui e não lá? Perguntas e mais perguntas surgem enquanto me convenço que a letra tem a preocupação e rima digna de uma mente que não enxerga somente uma ou duas cores. Há o inusitado ali, os tons de cinza de toda boa obra, e é muito bem feito.

O ritmo da bateria no clipe impõe a batida no chão, dos próprios pés, compassados. O estúdio vai ganhando mais detalhes, tudo vai clareando. Janelas grandes se abrem e revelam o céu quase cinza. Todos ali estão concentrados no som que fazem (quase preocupados). A sinfonia que poderia ser da Orquestra Contemporânea de Olinda, o arranque da voz que poderia ser Chico Science, o balanço que poderia ser emprestado Mangue Beat… é tudo Hugo dos Santos e suas companhias, cercados de afirmações de lugar, do lugar dele no mundo. Por essa particularidade encontrada, surte efeito.

Visões de caleidoscópios entram no jogo. À medida que a música termina, o clima dentro do estúdio parece mais descontraído, como se o objetivo de fazer um trabalho sincero e único tenha se cumprido nos segundos anteriores. Cenas de uma cidade antiga terminam por encerrar com a propriedade aquilo que se começou. Se a satisfação dos músicos parece morar do outro lado da tela, onde o “Longe é aqui” devo dizer que ela é completa e facilmente compartilhada desse lado.

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Mariana é de gêmeos, capixaba e jornalista, não necessariamente nessa ordem. Está em dúvida se gosta mais de ler ou de escrever. Espero que nunca descubra.

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