Resenha: Momo

Resenha: Momo

Momo

Os gregos & o Barroco

Ao contrário do que se pensa, Momo na mitologia grega era uma Deusa e não um Deus. Personificação do sarcasmo e da ironia, a Deusa filha de Nix, ‘A Noite’, era tão imprescindível que mesmo após tendo criticado e zombado sem medo e sem reservas os grandes Deuses do Olimpo, foi liberada por Zeus para continuar convivendo entre eles.

Marcelo Frota, o nosso Momo, diz que optou por este pseudônimo por se sentir mais livre para expressar seu temperamento irônico e crítico. Saindo da mitologia e partindo para psicologia Junguiana das ‘escolhas inconscientes’, ou ‘subconscientes’, acho que se pode concluir que a identificação com tal personagem mitológico vai além de seu temperamento sarcástico. É preciso muita coragem e força de caráter, além do talento para dizer o que nem todos gostam de ouvir. É preciso vocação para remar feliz contra maré e depois disso ainda encontrar força para criar novos paradigmas.

Marcelo desconstrói mitos e verdades absolutas com a facilidade de quem sopra uma pluma ao vento. Nisto reside um de seus maiores talentos.

Cadafalso

Palco exposto em local público para executar condenados à morte; Forca; Guilhotina.

“Ninguém vai morrer pela lâmina da faca… Ninguém vai moer o que sobrou dos meus ossos, forca quer me enquadrar”. Esta frase encerra a música ‘Cadafalso’, composta em parceria com Wado. O disco tem mesmo esta cara, de quem rejeita se enquadrar, até mesmo nos paradigmas que um dia, ele próprio criou para si. No contraponto de qualquer expectativa baseada em sua obra precedente, Cadafalso traz uma proposta sonora e conceitual completamente diferente na discografia do artista.

O disco tramado somente à voz e violão, parece ser um voo longínquo para a liberdade, rumo ao futuro incerto, ao mesmo tempo em que soa como um reencontro íntimo com um passado igualmente distante.

Autoral e quase hermético, o disco foi inteiramente gravado apenas pelo artista, tocando violão e cantando em todas as faixas. As poucas participações são sutis, como a parceria com Wado na composição de três músicas e uma ‘apropriação’ majestosa da música de Humberto Teixeira ‘Eu vou pro Ceará’, além da coprodução com Gilberto Fortes.

É pra se ouvir com ouvidos bem atentos, num lugar sossegado. Vale muito a pena ouvir as letras sendo decantadas suavemente, e o violão expressando uma incrível sensibilidade poética em dedilhados melódicos. Parece até um contrassenso, mas é verdadeiro dizer que o som nos chega suave, apesar de letras expressivamente fortes.

“Toda arte é um projeto de amor” – ‘Arte’ – Momo

Se você quer apenas ouvir um bom disco, Cadafalso já está recomendado! Mas se você gosta de ir um pouquinho mais além, e mergulhar na música em toda sua extensão de profundidade e intensidade, Cadafalso vai servir como uma riquíssima fonte de arte, que eu ousaria chamar de ‘Barroca’.

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Estuda música desde os 13 anos, desenvolve pesquisa na área da música independente , produtor de bandas de diversos estilos e compositor de trilhas sonoras.

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