Raul Seixas – Gita

Raul Seixas – Gita

Escrevo este texto coincidentemente no dia que Raul Seixas completaria 70 anos. 28 de junho. Um artista único, inesquecível e de extrema importante não apenas par ao rock, mas para a música brasileira. Junto com Paulo Coelho, compôs diversas músicas que entraram na cultura do brasileiro, ou alguém nunca ouviu falar do “Maluco Beleza”?

Pouco antes de lançar este disco, um caso curioso aconteceu. Raul fez um convite para Erasmo Carlos ir à sua casa. Uma festa mais íntima, apenas para pessoas mais próximas. Erasmo não conhecia a intimidade de Raul e avisou a esposa dele ‘lá na gravadora vivem falando que ele e o Paulo coelho matam um monte de bichos em rituais, que embebedam as pessoas, praticam satanismo. Então, cuidado com o que vai beber’. Chegando à festa, viu que não havia nada demais, apenas amigos bebendo e se divertindo. E foi a noite toda conversando sobre rock n roll, principalmente Elvis Presley.

Ao ser questionado sobre os rumores, Raul riu e falou que era apenas boato do pessoal da gravadora mesmo. “Eles não entendem a nossa proposta de ocultismo, com o rock e uma pegada brazuca”. Com isso, tudo que foi feito foi aproveitar as lendas e conseguir entrar no clima. As principais influências assumidas por Raul no seu trabalho eram escritores como Nietzsche, Lao-Tzu e George Orwell, e grandes malucos como Aleister Crowley, Timothy Leary, Carlos Castañeda e Humberto Rohden.

Em 1973, Raul lançou seu primeiro disco solo, intitulado Krig-Há, Bandolo, com várias músicas em parceria com Paulo Coelho. Durante os shows de promoção do disco, distribuiu um zine com mensagens da Sociedade Alternativa, um lugar onde todos poderiam fazer o que quisessem. A polícia recolheu tudo e prendeu Raul, mandando-o para os EUA em exílio. Raul Seixas e Paulo Coelho compuseram este disco após a volta de Raul.  Para a capa, ele foi com uma boina de guerrilheiro e uma guitarra bem vermelha – ele não tinha uma guitarra vermelha, essa fora emprestada-. Uma provocação direta aos militares. O que Raul não esperava era que o exílio  pudesse lhe trazer uma mídia que vendia disco. E Gita conseguiu alcançar 600 mil LP´s vendidos.

Enfim, o disco…

A abertura dele é com “Super Heróis”. A letra faz uma crítica as pessoas que têm famosos como semideuses. A sátira da letra é com o que era famoso naquela época, como Silvio Santos, uísque, Seleção Brasileira… O disco segue com “Medo da Chuva”, um grande clássico dele que, segundo Paulo Coelho, fizeram ao ver pessoas que são inertes na vida, aceitando tudo sem questionar, apenas sonhando com outras possibilidades.

Em “As Aventuras de Raul Seixas Na Cidade de Thor”, a pegada é mais nacional, que remete ao repente. ‘Água Viva’ é mais melancólica, uma música mais chorada de Raul. Linda canção, linda poesia e uma melodia com cravo marcante.

“Moleque Travesso” é influencia total em Elvis Presley, tanto em sua melodia quanto o jeito de cantar. Raul nunca escondeu isso em sua vida.  Mas em “Sessão das Dez” é que chega ao ponto alto do disco. Letra fantástica, melancolia na dose certa e memórias românticas da vida. “Ver teatro e ver cinema era minha distração”.

“Sociedade Alternativa” é o hino. Foi o hino e será o hino. Acredito que deixou de ser uma obra musical, de arte, para virar cultural, incorporado na vida das pessoas, tal qual Shakespeare, a Monalisa, as gírias do dia a dia. Falar sobre a letra? Jamais, não teria tamanho atrevimento. Inarrável este hino dos malucos, dos viventes do Brasil. Apenas ouça e tente não ficar com o grito de “viva a sociedade alternativa” na cabeça. Apenas tente.

“Trem das 7” é uma das canções mais lindas da música brasileira. Regravada por diversos artistas, Raul ainda a regravou em inglês, buscando o mercado americano. “S.O.S.” é uma das lendas que ele conta sobre sua vida e o contato com discos voadores. A introdução desta música é de uma guitarra semiacústica americana de luthieria composta nos EUA após ele ver um show de Ray Charles.

“Prelúdio” é curtinha, com a poesia marcante, que cita o ‘sonho que se sonha junto é realidade’. Genial. Os pianos ficaram por conta de Paulo Coelho nesta canção. Em “Loteria da Babilônia” é de uma ironia muito bacana. Conseguiu tudo na vida, mas cadê o rock, cadê a diversão? Bem na lata.

Para fechar, a faixa título. Somente Raul para colocar a faixa título e música de trabalho de um disco como a última do Lado B. “Gita” é inspirada no livro sagrado do Hinduísmo Bagavadguitá, também conhecido pela grafia Bhagavad-Gita, que significa “Canção de Deus”. O texto, escrito em sânscrito, relata o diálogo de Krishna (uma das encarnações de Vixnu) com Arjuna (seu discípulo guerreiro) em pleno campo de batalha. “Perguntas não vão lhe mostrar, que eu sou feito da terra, do fogo da água e do ar”… “Eu sou o amargo da língua, a mãe o pai e o avô, o filho que ainda não veio, o início, o fim e o meio”. Auto–explicativa.

Raul foi um ícone da música brasileira. Mesmo quem não gosta, é inegável que ele fez história e continuará na cabeça de muita gente. Este disco, apesar de não ser o melhor em minha opinião, tem o marco da explosão de Raul em vendas. Primeiro disco de ouro, primeira turnê pelo Brasil com casas lotadas e quando ao ar livre, gente em cima de gente… Raul foi um grande nome que ficará pra sempre nas lendas brasileiras…

delirium noc

Para este disco, recorri ao nome e ao teor da cerveja. Ao nome para fazer jus ao Maluco beleza, e ao teor para ficar maluco, beleza?

O nome Delirium Tremens, em latin, é utilizado para descrever a reação de psicose causada pela abstinência em alcoólatras. Deve ser por isso que o símbolo da cerveja é um elefante cor-de-rosa. Quando esta cerveja chegou pela primeira vez ao mercado americano tiveram que recolher todas as garrafas pois existe uma lei por lá que proíbe o incentivo ao consumo exagerado de bebidas alcoólicas. Acreditava-se que seu nome provocava as pessoas a beber como loucos além de ser ofensivo àqueles que possuíam a reação (delirium tremens) verdadeiramente. Ela foi durante esta época comercializada com o nome de Mateen Tripel nos EUA.  (Para que vocerveja).

Ótima cerveja. Bem complexa e saborosa. Tanto o aroma quanto o sabor são muito bons, com boa presença de maltes, um bom frutado lembrando frutas escuras secas e bastante fenólica. Bom amargor no final. O corpo é maravilhoso, bem denso e licoroso. Uma cerveja muito prazerosa de se beber. Com uma cor amorronzada e turva, espuma de média duração, bege escura, combina perfeitamente com carnes mais fortes e picantes. Teor de 8%, certamente após uma garrafa vai se sentir meio maluco. O valor média dela é de R$50 a garrafa de 600 ml.

Divirta-se.

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Pedro Cindio - Jornalista narigudo, músico frustrado e apaixonado por música, tenho um toc de só escutar discos completos. Cervejetariano e feio, mas meu humor salva a aparência.