Tetê Espíndola e o Lírio Selvagem – 1979

Tetê Espíndola e o Lírio Selvagem – 1979

Vamos fazer uma viagem, agora, para o Mato Grosso do Sul. Nesta coluna já passamos pelo Sul, pelo nordeste, passamos bastante pelo eixo Rio-SP-MG… Mas as músicas do Mato Grosso são belas, gostosas de escutar.

Tetê é dona de uma voz marcante, única e inconfundível. No Brasil ficou famosa em sua carreira solo, especialmente após vencer o Festival dos Festivais(já resenhado nesta coluna) com a música “Escrito nas Estrelas”. O problema é que ela ficou marcada apenas por esta música, e o começo de sua carreira é simplesmente sensacional.

Teresinha Maria Miranda Espíndola, ou Tetê, nasceu em uma família de sete irmãos, onde todos acabaram tornando-se músicos. Sua mãe, Alba Miranda, foi uma grande influência para que Tetê e seus irmãos fossem para o caminho da música. Sua veia artística também era influenciada por seus primos trigêmeos que se apresentavam tocando piano a seis mãos. Depois de muito trabalhar, eles conseguiram inclusive tocar para Getúlio Vargas.

Em 1968, os irmãos Tetê, Geraldo, Celito, Sérgio e Alzira, com permissão dos pais, decidiram ganhar dinheiro e trabalhar no que gostavam e assim formaram o grupo LuzAzul e passaram a executar cantorias na estrada que liga Campo Grande a Cuiabá.

E foi nos arredores de Mato Grosso, cantando com os irmãos, de cidade em cidade, que Tetê se descobriu, num local chamado Chapada dos Guimarães. Começou a testar sua voz cantando todos os dias.

Aos 14 anos, Tetê ganhou um festival de música em Campo Grande, com a canção “Sorriso”, cuja letra fora escrita pelo irmão. A partir de então, Tetê começou a pensar em seguir carreira em outros estados. Após anos cantando para o público de Campo Grande, em 1977 o Grupo LuzAzul decide ir para a Cidade de São Paulo tentar carreira. Vão primeiro Celito e Tetê. Eles chegam e começam a tocar em barzinhos. Os dois, vendo que estavam se consolidando, abriram espaço para os outros irmãos se transferirem de vez para São Paulo.

Os irmãos fazem testes em gravadoras e passam. Acabam por fechar contrato com a Polygram/Phillips, e a pedidos da própria gravadora, mudam o nome LuzAzul para Tetê e o Lírio Selvagem, lançando assim seu primeiro trabalho em 1978. Em 1979, Tetê o e Lírio Selvagem se desfaz, a gravadora decide lançar Tetê em carreira solo. Mas vamos conhecer melhor o disco de estreia dessa turma…

O disco abre com a voz de Tetê em um grande destaque na canção “É necessário”. O curioso deste disco, que já percebemos de cara, é que todos os refrãos são de uma melodia magnífica, bem cantado e com destaques das vozes da família Espíndola. “Quando você cai dentro do meu coração, é como se o sole a lua se esparramassem pelo chão”…  Este refrão tem uma pegada bem rock(para a época e para Tetê também). A virada de bateria neste refrão é muito bem encaixada, como poucas na música brasileira.

Seguindo com  “Rio de Luar”, esta música é uma pegada bem brasileira, com participação de Almir Sater, que dá sua característica para a música, onde o refrão é cantado por todos os irmãos.  “ai que saudade que me dá, de ver a morena pular, tomando banho de cachoeira e nadando num rio de luar”. Este refrão cantado por todos é de arrepiar.

O disco segue com ‘Voos Claros’. A voz, masculina neste caso, casa muitíssimo bem com o timbre do violão(em minha pesquisa não encontrei quem canta. Quem souber por favor, comente aqui na coluna).  Tetê entra com o dueto, com uma orquestração bem sutil ao fundo.  Agora, ao chegar ao refrão, é uma das composições mais belas e complexas que ouvi. Tetê canta uma poesia e a outra voz máscula canta outra. E nesta chegada, ao final termina a música. Bem direta, dá vontade de escutar mais. Este refrão é incrível.

“Quando você tá por perto” segue na linha do dueto. A quebrada é um tanto dançante, uma linha que chega próxima a Black Music(especialmente o baixo) que depois, no refrão, recebe muito mais peso.  Em “Andorinha manca” o coro fica em destaque. Lembrando muito a pegada de choro da música sertaneja.

A música “Caucaia” é uma grande crítica social. O refrão dela é claramente um ataque a iniciativa privada que roubava riquezas da região da cidade de Caucaia. “Caucaia do alto tomará, Sua rara mancha derradeira,  Na região não caia na mão das empreiteiras”. De arrepiar. Seguindo com “A Catarata”, é a típica música sertaneja raiz, falando da natureza, das belezas que o mundo nos dá, com um certo lamento. Porém o início tem uma pegada mais rock.

“Bem-Te-Vi”  é o verdadeiro lamento sertanejo. Mais calma, com uma poesia linda de amor. “O teu olhar diz que ama, o fogo do meu coração. Em tuas mãos tuas chamas prendem o bem-te-vi”.  Na música seguinte, “Em Piralenta”, a voz de Geraldo Espindola lembra muito a de Milton Nascimento. Lindo timbre. Preste atenção no baixo desta música.

“Santa Branca” é uma reza, de linda melodia composta pela família Espíndola.  Uma simplicidade necessária para este momento do disco, para chegar a “Pássaro Sobre o Cerrado”, que nos leva a uma viagem maravilhosa aos bens naturais do Mato Grosso.

O disco encerra com “Alegria de cantarolar”. Bom, como uma obra de arte linda, com vozes fazendo de tudo em todas as emoções, realmente percebemos a alegria musical destes irmãos. O início é bem caipira, com uma crescente da viola. Perceba os gritos que Tetê dá durante a música, onde parece bastante um pássaro. Que disco… que disco.

Para acompanhar um disco tão peculiar, escolho a Bretta, da cervejaria Jupter. Uma Saison, estilo criado nas fazendas do sul da Bélgica, tem suave acidez, aroma de frutas amarelas e cítricas e toques rústicos, típicos de cervejas fermentadas com leveduras selvagens.

A suave acidez e boa carbonatação combinam com carnes grelhadas, as notas rústicas se equilibram bem com pratos delicados como cogumelos e o toque cítrico é ótimo para acompanhar saladas.

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Pedro Cindio - Jornalista narigudo, músico frustrado e apaixonado por música, tenho um toc de só escutar discos completos. Cervejetariano e feio, mas meu humor salva a aparência.

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