3 PERGUNTAS PARA: JUP DO BAIRRO

3 PERGUNTAS PARA: JUP DO BAIRRO

Você já deve ter ouvido falar da Jup do Bairro, certo? Backing vocal da Linn da Quebrada? Sim, é essa!

Jup do Bairro é multi artista autodidata, educadora, palestrante, atriz, produtora e cantora. É uma das principais figuras da cena paulistana, uma importante voz pelos direitos das pessoas trans. E em junho, ela lançou seu tão aguardado e maravilhoso EP CORPO SEM JUÍZO. Acompanhada pela produção de Dj Badsista, e convidados de peso como: Linn da Quebrada, Rico Dalasam, Mulambo e Deize Tigrona, o projeto é resultado de anos de experiências e descobertas vividos pela cantora.

Em entrevista, Jup conta mais detalhes sobre seu processo criativo, parcerias e ativismo.

Estreando nossa nova coluna –  3 PERGUNTAS PARA JUP DO BARRO:

1. Falando sobre a sua carreira, você trabalhou muito tempo ao lado da Linn da Quebrada, além de estar no disco dela, o “Pajubá”, está também ao lado dela no programa “TransMissão”, do Canal Brasil. Quando você decidiu que era a hora de seguir solo, lançar seu disco e colocar a sua voz também em primeiro plano?

Eu comecei a compor aos 13 anos, sem muitas pretensões, era uma maneira de materializar meus pensamentos, dores e delícias. Em algum momento eu percebi que aquilo poderia ser música e comecei a experimentar essa possibilidade desde então. Estou vivendo e sobrevivendo da música a mais de dez anos. Logo quando comecei a me apresentar, ainda muito jovem no Centro de São Paulo eu assinava minhas performances apenas como Jup e como eu ainda era muito nova na cena paulistana, muita gente ainda não me conhecia como Jup. Para identificar melhor a galera falava “a Jup do Bairro” pois no ponto de ônibus a galera sempre ia na plataforma sentido Centro e eu era a única que ia em sentido Bairro. Linn e eu nos conhecemos na Virada Cultural de São Paulo, ela estava performando em um palco e na sequência eu ia fazer um show. Na troca de palco, amigas em comum nos apresentaram e logo no começo meus olhos se encheram quando eu a vi e perguntei: “é Linn de linda?” e ela virou ou olhos como se tivesse achado aquela piada infame. Depois disso começamos a estar no mesmo line de festas e boates de São Paulo. Um dos motivos de aproximamos tanto é que ela e eu precisávamos esperar horas para começar a rodar ônibus para nossas casas. Ficávamos em terminais, frente de estações de metrô até abrir. Com isso fomos dividindo nossas dores, delícias, pensamentos e até comida. Linn e eu somos e fomos as pessoas mais brutais e generosas uma com a outra. Com muita transparência e afeto conseguimos criar imaginários para nós e influenciarmos muitas outras pessoas com nossas dúvidas e interrogações. Tive o prazer de co-criar não só Pajubá e performance com ela, mas também um lugar de pertencimento e invasão de espaços, disputamos juntas a exploração de novos territórios e novas possibilidades. Inclusive de como tornar as redes afetivas em redes efetivas de fortalecimento e coletividade. “CORPO SEM JUÍZO” nasce também desses atritos e muitos outros que podem surgir em exploração da arte e meu corpo.

2. Comenta um pouco sobre o disso, dos seus processos criativos e como você foi criando seu próprio jeito de produzir? 

Toda a construção do EP foi levantada coletivamente. Desde o financiamento coletivo que levantei no ano passado até a pós-produção. Acredito que seja preciso ir além das redes afetivas, precisamos torná-las efetivas: nos responsabilizamos pela criação e manutenção de imaginário, fortalecimento e avanço coletivo. Não acredito na representatividade una. “CORPO SEM JUÍZO” não é só um EP biográfico, vai para além justamente por não terminar em mim. Mexo em minhas feridas abertas mas devolvo isso para ouvintes. A sonoridade também foi construída de forma coletiva. BADSISTA e eu temos gostos musicais muito parecidos e logo quando começamos a produzir o disco eu queria que permeasse as minhas referências atuais e antigas, que por sinal também eram as dela. Durante a produção eu estava ouvindo tudo que curtia na adolescência como Korn, Slipknot, Runaways, Rage Against The Machine, Pitty, Luxúria e muitas vertentes rock nacional e internacional. Passei também por músicas e composições nostalgias que ouvia desde criança como Nelson Gonçalves, Paulo Diniz, Elza Soares… Até chegar no hip-hop new school é o rap nacional que foram o berço da minha trajetória.
Foi um desafio muito grande ingressar em melodias que fugiam do meu flow e dicção já apresentados, estudei muito. Principalmente para esse álbum tivesse uma linearidade sonora contínua mesmo com tantos gêneros musicais diversos. E todos os processos de clipes, faixas e materiais de divulgação são construídos nesse presente possível, variável e flexível.

3. O seu trabalho é marcado por um forte teor político. O que vêm primeiro: a Jup artista ou ativista?

A música pra mim foi uma oportunidade de me manter e me sentir viva, uma forma de necessidade. Eu não nasci com dotes artísticos porque eu não fui instruída para a arte, mas sempre estive rodeada de arte ao mesmo tempo. Pixos, bailes funks, batalhas de rima, produções de moda e culturas marginais, muita coisa. Mas tudo isso nem sempre é considerado arte pois não está nas galerias, holofotes, mídias de massa e grandes instituições. Contudo, para boa parte dos artistas marginais brasileiros, a criação vem a partir da dor causada pelo sistema, comigo não é diferente, minha música vem a partir do meu corpo, da minha vivência, dores e delícias. Ao compor sinto a dor de mexer em feridas abertas, no palco sinto o alívio da terapia de cura cicatrizando os buracos. Não sei o que acaba vindo primeiro, o ativismo de certa forma foi involuntário e a arte acontece como possibilidade real.

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De São Paulo, apaixonada por cultura, arte e comportamento humano. Movida a música.