Plateia S/A: Ney Matogrosso: “Atento aos Sinais”
Nota: 9.0
Artista: Ney Matogrosso
Disco: Atento aos Sinais
Selo: Som Livre
Ano: 2013
Aos 72 anos o consagrado artista lança disco com foco na produção musical de compositores da “nova geração” e mais uma vez mostra que, além de muita versatilidade, também possui argúcia.
Sou uma dessas pessoas que acredita que qualidade musical não tem a ver com o tempo (não importa se a década é 60, 70 ou 80), mas sim com talento e competência.
Para mim, o prazer proporcionado pela audição dos trabalhos de artistas como Tamy, Rodrigo Campos, César Lacerda, Rafael Martini, Pablo Castro, Kristoff Silva, salvo pequenos detalhes afetivos, é o mesmo que me proporcionam Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Não se trata de época ou éthos, mas de atentar-se ao fato de que engessar ou cristalizar um movimento não vai nos levar a lugar nenhum. Um cânone só existe para ser rompido por algo que normalmente também vai se tornar um cânone. É o princípio da falseabilidade que Karl Popper aponta na ciência, agindo na arte musical. Segundo ele, a essência da ciência está na possibilidade de refutação de qualquer teoria, passando ela a ser verdadeira apenas se for falseável (tudo aquilo que não é refutável não pode ser considerado científico). E assim caminha a humanidade, para a nossa sorte ou azar –depende se para você o copo está meio cheio ou meio vazio.
Ney Matogrosso por si só já poderia ser um cânone da música brasileira, mas ao invés de se colocar em um pedestal e viver somente do passado, o cantor volta à cena com “Atento aos Sinais”, disco com 90% do repertório inédito e que é cheio de beleza e força, se afastando com classe de um possível engessamento.
No disco podemos ouvir e sentir com clareza o emaranhamento entre o intérprete e as subjetividades enunciadoras para as quais ele empresta voz – e, se tratando de Ney Matogrosso, corpo. É emocionante poder identificar através de entonações e emoções que se evidenciam a cada sílaba, a facilidade com que ele se locomove por qualquer tema ou arranjo através de um uso refinado de sua tessitura vocal.
Ao mesmo tempo mítico e moderno, “Atento aos Sinais” é um acontecimento que ajuda a dar fôlego às pequenas (r)evoluções musicais que se esboçam em cantos e lugares por este Brasil afora, afinal, o que temos é um grande cantor interpretando grandes compositores. Além de artistas consagrados como Vitor Ramil, Paulinho da Viola, Pedro Luis, Dani Black, Lenine e Arnaldo Antunes, estão no disco músicas de Criolo, Tono, Zabomba, Vitor Pirralho, entre outros. No entanto, engana-se profundamente quem pensa que esse trabalho trata-se de Ney Matogrosso dando voz aos “pequenos”; é quase boçal constatar uma coisa dessas. Creio que o que acontece é uma relação de intercâmbio artístico de grande relevância para a música nacional como um todo.
Atento aos próximos passos
Antes mesmo de virar disco, o cantor já vinha fazendo um elogiado show com o mesmo nome e com 19 canções e para aqueles que preferem o Ney Matogrosso performer, esse ano será gravado o DVD deste mesmo show com repertório completo.
“Atento aos Sinais” conta com a produção impecável de João Mário Linhares e Sacha Amback, que além de tocar piano, hamomnd B3, rhodes e sintetizadores, assina os arranjos junto com a banda, formada por músicos de primeira linha como o inconfundível Marcos Suzano (percussão, programação, vocais), Felipe Roseno (Percussão), Maurício Negão (guitarra, violão, vocais), Dunga (baixo, vocais), Everton Moraes (trombone) e Aquiles Moraes (trompete, flugelhorn).
Mesmo que o disco tenha uma inevitável assinatura no tempo e no espaço, a força interpretativa de Ney Matogrosso continua provando-se atemporal.
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