Wado: 1977 (2015)

“Eu era seu lar” é o que afirma o artista Wado na canção de nome Lar, que abre 1977, o oitavo disco de sua carreira lançado em 2015. Mais do que uma afirmação pontual dita e repetida numa canção de abertura, Wado entrega-se ao que se segue no decorrer do disco, como se fosse ele próprio uma grande casa onde ao adentrarmos, portas encerram-se atrás de nós, transformando-nos em testemunhas da intimidade do artista através das quatro paredes cômodo adentro.

Wado, nascido Oswaldo Schlikmann Filho, cantor e compositor catarinense radicado em Maceió/AL, em 1977 nos apresenta ao seu espírito inquieto e versátil com bastante segurança. O disco parece caminhar em direção a experimentação de novos ritmos, novas misturas, novas texturas e, embora em alguns breves momentos provoque a impressão de se perder em divagações rítmicas e/ou tentames experimentais, ainda assim o faz com sensatez e critério.

Em 1977, Wado parece selar especial compromisso com a palavra, permitindo que ela se apresente em seu estado nativo, originário e bruto. Como numa espécie de torre de babel de ar latino, irrompe as fronteiras da língua e da linguagem e confia às vozes convidadas o discurso de suas composições. É o caso das canções Galo que conta com a  participação da mexicana Graciela Maria, Deita com o português Samuel Úria, Condensa com Martim Torres/Portugal e Belén Natalí/Argentina, e do uruguaio Gonçalo Deniz em Mundo Hostil.  Lançado pela gravadora Deck, Wado assina a produção do álbum e além das participações internacionais o disco ainda conta com nomes como Lucas Silveira, vocalista da banda gaúcha Fresno, João Paulo, vocalista da banda alagoana Mopho e Marcelo Camelo, que participa da canção Palavra Escondida, composta por Wado em parceria com Zeca Baleiro.

Guitarras “sujas” e “rasgadas” presentes nas canções Lar e Cadafalso (faixas 1 e 2 do disco) nos dá a impressão de que o disco seguirá vestido com trajes roqueiros do início ao fim, como numa escalada progressiva de peso onde a próxima canção promete trazer ainda mais ânimo e volume que a anterior.  Mas ao iniciar as canções Deita e Galo (faixa 3 e 4) experimentamos a ruptura de tal palpite, onde então somos conduzidos à sonoridades imprevisíveis.  Isso nos mostra que em 1977 devemos interpretar cada canção como personalidades únicas e de gênios individuais que chegam, dizem o que querem dizer, e se vão. Tal característica possibilita que nas composições se equilibre no meio fio os timbres de peso mais marcado com a energia poética mais amena, o que nos leva a enxergar as quebras dinâmicas de ritmos ao passar de cada faixa, como uma atitude atrevida e sem dúvida, positiva.

1977 apresenta-se como um ótimo disco de entrada para aqueles que por alguma razão ainda não estabeleceram contato com o trabalho de Wado, artista  que ainda um tanto distante dos holofotes da grande mídia, parece conquistar em especial os mais conectados às produções artísticas autônomas.