Bastidores e devaneios: Leo Middea e A Dança do Mundo
*Foto: Ramon Almeida
A música transforma vidas em histórias que merecem ser contadas com o amor e a intensidade de quem esteve ali. Por isso, uma ou duas vezes ao mês vou compartilhar com vocês algumas pequenas histórias e reflexões que possam servir de alguma forma a quem está nesta luta diária contra a maré.
Leo Middea
Ele chegou a São Paulo com um violão nas costas e aquela sandália velha. Sem querer, acabou se hospedando no meu sofá – hospedagem que duraria um ano e alguns meses, entre idas e vindas. O primeiro show rolou no Kabul, para pessoas que nunca ouviram o som. Naquela noite, em que eu ainda não podia dizer o que ia no coração a um ilustre desconhecido, fui embora antes e dormi como uma pedra. Ele saiu logo depois e ficou esperando algumas horas do lado de fora de casa, no frio, todo trabalhado no carioca calorento. Foi assim que começou uma longa jornada e uma estreita amizade.
Leo Middea é isso. É do mundo, não é do julgamento, é do amor. As muitas conversas e sons no sofá reverberaram em um trabalho incrível. O disco, que já previa “A Dança do Mundo” do cara de 20 anos e com espírito de 60, foi trabalhado delicadamente. Cada música era um pedacinho do neném que tentávamos construir à perfeição. Manhãs, dias e noites dedicadas a ouvir e pitacar as produções e arranjos que chegavam pelos fones cuidadosos de Peter Mesquita.
É percussão que vocês querem? Vamos buscar os melhores! E, assim, chegamos aos sons amazônicos do Trio Manari. É pop que precisa? Vem, Laura Lavieri, botar voz aqui. Intensidade? Ei, Bruna Moraes, bora cantar. Versatilidade? Vanessa Moreno, faça suas muitas vozes no coro mais lindo de Cirandeiro que você já ouviu. Ar fresco? Vamos chamar só gente nova e talentosa para o coro. E assim, com muita intuição e carinho, construiu-se esse disco que passeia por todas as vertentes musicais sem perder unidade e verdade. Porque Leo Middea é muitos em um: muitas vivências no mesmo taurino esfomeado e com uma alma paradoxalmente tranquila e ansiosa.
Espíritos inquietos se encontram. Foi o que aconteceu em uma das melhores parcerias que eu poderia narrar. Manhãs inteiras – 3, 4 horas – foram dedicadas a conversas profundas regadas a um bom café com Nutella, em Porto Alegre – cidade esta que não só demonstrou um acolhimento caloroso à arte, como foi essencial para repensar estratégias, caminhos e vida.
Mas isso é algo que o artista já faz há tempos. Talvez nem todos saibam de seu envolvimento profundo com o Arte de Viver – um tipo de estilo de vida baseado em técnicas de meditação e respiração desenvolvidas pelo indiano Sri Sri Ravi Shankar. O que isso tem a ver com a música? Além de permitir o equilíbrio emocional para seguir uma carreira que tem suas dificuldades financeiras e de fluidez (sempre levando em consideração tempo, espaço e pernas para caminhar), foi essencial preparar-se na própria Índia para o lançamento do álbum. Enquanto Leo ficava em silêncio por lá, a gente mixava daqui e organizava a demanda para o streaming, para a imprensa, para as casas de show.
Num momento onde só se falava em impeachment, o filho de Caê com Gil vinha cantar o amor – o sofrido, o feliz, o solitário. E já começava a dar passos pelo Brasil, rumo ao mundo. Teve São Paulo – muitas vezes, incluindo um lançamento lindo no Serralheria e uma tarde incrível no SESC Vila Mariana; Rio de Janeiro, Goiânia (agradecimentos eternos a essa cidade <3), Brasília – com direito a banho na lagoa; Porto Alegre (duas vezes), Minas Gerais – perdeu-se a conta e ainda rendeu uma final no Festival da Canção.
Em suma: até aqui, temos um músico com um disco (muito bom, aliás, chamado “Dois”) lançado em 2014 e que viveu três meses entre bares argentinos. Um dia, ele teve questões pessoais que o fizeram seguir adiante no sonho – dessa vez com a voracidade de quem sabe o que quer. Gravou o segundo disco e se jogou pelo país, que começou a dar sinais de pequenês. Sites portugueses já mostravam, então, qual seria o destino.
Agora, Leo desbrava Portugal com sua música e com sapatos fechados. Conheceu a neve, toca na rua, vai a shows que não ia antes, bebe vinho. As composições, que chegam diariamente via WhatsApp, refletem um artista que já caminhou muito e sabe o que quer. Trazem a leveza e a paz de quem se encontrou num país onde as casas oferecem cachê para música autoral (#entendedoresentenderão). Em breve, o resultado vai estar aí novamente, pronto a ser compartilhado e deixar todo mundo mais entregue.
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