Resenha: Bruno Roberti
by Di Pietro
Gente, vamos combinar, resenhar sobre um artista baseando-se no press release, não dá! Pronto falei, não dá mesmo! É um clichê ao qual me nego veementemente endossar.
O sujeito lança um disco. O primeiro. É bem assistido, tem site, assessoria de imprensa e por consequência um press release. A gente dá uma busca no santo google, e é sempre o mesmo blá blá blá: ‘O disco é bom tecnicamente, tem participação de Toninho Horta, Seu Jorge, etc. e tal, o carinha formado em marketing pela ESPM cansou do mundo das grandes corporações e largou tudo pra se dedicar à música…’
… so… congrats, it’s a great feat, anyway… but… that’s not all!
à savoir: escalas pentatônicas cabra da peste!
O disco é muito bom! Tecnicamente impecável, arranjos irreprocháveis. A faixa 2, ‘não arrega, não’, lembra muito Elis. A letra, a melodia, o ritmo e até os arranjos, arrisco dizer que, se Elis fosse viva toparia de boa cantar esta música. Quase por ironia, a faixa 3, ‘vapor’, lembra alguma música de Djavan que Gal cantaria, embora a letra poderia bem ser um ensaio do Wally Salomão. A faixa ‘eu comigo mesmo’, me impressionou deveras: Uma letra moderna, com o tom irônico de um Chico, se ajustou escandalosamente bem ao estilo retrô – um luxo só, me lembrou ‘Corta Jaca’ da Chiquinha Gonzaga. A R&B, ‘encanto’ me conduziu a Celso Blues Boy e, meio de longe parece flertar com Etta James, The Queen. Chamo atenção para a sensacional ‘for all blues’. Taí, esta canção, não me lembrou ninguém. Fico imaginando que esta deve ser a ‘carinha’ do Bruno desnudo. Letra fofa e inteligente, com arranjo incrivelmente bem harmonizado, como uma contradança entre o blues e forró. Perfeita! Entrou pra minha lista entre as mais bonitas dos últimos anos. ‘Descarada’, a tal que tem a participação de seu Jorge, ficou com jeitão do Simonal, embora em alguns momentos me tenha lembrado ‘feijoada completa’ do Chico. Já ‘birita’ me aludiu a uma cena de Cartola ou Vinicius enchendo a cara em um bistrô parisiense. ‘Revoltadinho’ podia ser uma ode à um hibrido de Cazuza com Paulinho da Viola. Por fim, a melancólica ‘desnecessário’, lembrou-me um tantinho da Ângela Ro Ro.
Eu acho bem legal dizer, que todas as ‘referências’ que citei, foram oriundas do meu próprio software cerebral. Não sei se ele tem estas referências de fato, ou conscientemente. Outras pessoas podem fazer conexões diferentes das minhas. Em geral, artistas não gostam muito de serem comparados a outros, mesmo que estes outros sejam ‘grandes’, porque todo artista de alma, como o Bruno, busca imprimir sua própria alma, coração, verdade, conceito, ou seja, intenta que seu trabalho seja autoral no sentido de ‘original’. Eu, de minha parte, acredito, que intentar ser original (fazer algo que nunca foi feito ou que não se pareça com ninguém) é tanto uma grande bobagem, quando uma tarefa ingrata, pra não dizer inglória mesmo. Inglória, porque ninguém nasce uma tábula rasa. Já nascemos carregados de informação genética, e o ambiente se encarrega de nos adicionar conteúdo de toda sorte, desde que começamos a respirar. E também é uma grande bobagem, porque não ser exatamente novo, original, não significa ‘não ser bom’.
Eu particularmente, não ouço sons novos procurando referências. Não mesmo! No entanto isto ás vezes é inevitável, considerando que tenho uma considerável bagagem musical armazenada em minha memória sonora. No entanto, que isto não seja um decreto pejorativo. Ao contrário, foi uma experiência extremamente prazerosa ouvir o disco do Bruno, uma, duas, três, quatro, dez, vinte vezes, porque além de ser bom tecnicamente, me causou sentimentos, me fez questionar, me fez viajar criando cenas e canários mentais que passaram como filmes em minha mente. E, até onde me concerne, arte de verdade, é isto, causa rebuliço nas pessoas, nos faz sonhar e viajar!
Neste primeiro trabalho do Bruno eu só senti falta de uma coisa: do risco! Gostaria que tivesse arriscado um pouco mais na voz, queria ter sentido mais ‘fome’ no jeito de cantar. Fiquei com a imagem de um artista se lançando vorazmente ao precipício, mas talvez não por coragem, e sim por destemor, como se de alguma forma ele soubesse que lá em baixo uma cama elástica ou uma rede, amorteceria sua queda.
Ainda assim, o cara é brilhante, realmente muito, muito talentoso, e muita água ainda vai passar por debaixo desta ponte.
No seu desabafo inicial em ‘lar’
‘e se eu deixar todo o conforto
e me atirar na vala do mundo
e se eu rodar em panos rotos
e viajar…
… um cidadão que não tem lar
meu coração é o meu lugar’
Bruno está entregando seu coração à arte, ao mundo e confessando intimamente a busca na construção de seu novo lar, seu lugar de real pertencimento, ‘a compreensão de que qual seja a minha história no futuro’ … ele já sabe bem, ao menos, aonde e com quem não vai estar…
Welcome boy! A arte agradece a sua virada de mesa!
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