Lula Cortes e Zé Ramalho – Paêbirú – 1975

Lula Cortes e Zé Ramalho - Paêbirú - 1975

Texto do grande artista plástico Raul Córdula para a contracapa do LP “Paêbirú: Caminho da Montanha do Sol, Lula Côrtes & Zé Ramalho”…Uma verdadeira viagem astral!

 

“Naquele tempo, o Senhor dos Cristais vestiu sua mais bela túnica de opala e disse: Vinde irmãos, pois que ELE chegará agora. Virá do alto, em sua águia, despido de ódios e de medos. Virá com seus raios e sua arte e sua barba vermelha. Nos ensinará o trato das pedras e dos metais, o manejo dos sonhos e o mistério das sementes. / E eis que, em estando todos ao redor da pedra, ELE apontou no horizonte como uma estrela azul. Chegou suave e pousou, e houve silêncio. / A irmã cobra e o irmão calango tremeram e pensaram: que nosso pai Sol e nossa Mãe Lua sejam louvados, pois que ELE, o irmão homem, chegou. E o homem deixou sua águia, pisou o chão e disse: Aqui é um novo reino, começou uma nova eternidade. Tomou pela mão o irmão felino e saiu cortando o chão com seus instrumentos fantásticos e semeando uma nova vida. / Primeiro é preciso conhecer a água, sua profundidade é cósmica; Depois o fogo, o calor que é vida e explosão; O Ar a força, a ação. A terra: Tudo e nada. / Depois ELE mostrou as coisas: „isso aqui é fibra‟e desenhou o agave sobre a pedra. Assim fez com todas as coisas. Depois disse que se chamava SUMÉ./ Comeu alguns grãos, bebeu alguma coisa muito amarga e deitou-se no colo da senhora dos granitos./ Partiu com a madrugada em busca do PAEBIRU./ Nos seus passos o rastro de sementes rumo ao Sul e ao Pacífico…”

O disco Paêbirú é de fato uma viagem astral de Lula Cortês e Zé Ramalho.

Vamos entender o disco

No dia 29 de dezembro de 1598, os soldados liderados pelo capitão-mor da Paraíba, Feliciano Coelho de Carvalho, encalçavam índios potiguares quando, em meio à caatinga, nas fraldas da Serra da Copaoba (Planalto de Borborema), um imponente registro de ancestralidade pré-histórica se impôs à tropa. Às margens do leito seco do rio Araçoajipe, um enorme monólito revelava, aos estupefatos recrutas, estranhos desenhos esculpidos na rocha cristalina.

O painel rupestre se encontrava nas paredes internas de uma furna (formada pela sobreposição de três rochas), e exibia, em baixo-relevo, caracteres deixados por uma cultura há muito extinta. Os sinais agrupavam-se às representações de espirais, cruzes e círculos talhados, também, na plataforma inferior do abrigo rochoso.

Inquietado com a descoberta, Feliciano ordenou minuciosa medição, mandando copiar todos os caracteres. A ocorrência está descrita em Diálogos das Grandezas do Brasil, obra editada em 1618. O autor, Ambrósio Fernandes Brandão (para quem Feliciano Coelho confiou seu relato), interpretou os símbolos como “figurativos de coisas vindouras”. Não se enganara. O padre francês Teodoro de Lucé descobriu, em 1678, no território paraibano, um segundo monólito, ao se dirigir em missão jesuítica para o arraial de Carnoió. Seus relatos foram registrados em Relação de uma Missão do rio São Francisco, escrito pelo frei Martinho de Nantes, em 1706.

Em 1974, quase 400 anos depois da descoberta do capitão-mor da Paraíba, os tais “símbolos de coisas vindouras” regressariam. Dessa vez, no formato e silhueta arredondada de um disco de vinil. A mais ambiciosa e fantástica incursão psicodélica da música brasileira – o LP Paêbirú: Caminho da Montanha do Sol, gravado de outubro a dezembro daquele ano por Lula Côrtes e Zé Ramalho, nos estúdios da gravadora recifense Rozemblit.

Contar a história do álbum, longe da amálgama das pessoas, vertentes sonoras e, especialmente, da chamada Pedra do Ingá que o inspirou, é impossível. Irônico é que o LP original de Paêbirú também tenha se convertido em “achado arqueológico”, assim como a pedra, 33 anos depois de seu lançamento. As histórias sobre a produção do disco, como naufragou na enchente que submergiu Recife, em 1975 e, por fim, se salvara, são fascinantes.

A prensagem de Paêbirú foi única: 1.300 cópias. Mil delas, literalmente, foram por água abaixo. A calamidade levou junto a fita master do disco para que a tragédia ficasse quase completa. Milagrosamente a salvos ficaram somente 300 exemplares. Bem conservado, o vinil original de Paêbirú (o selo inglês Mr Bongo o relançou em vinil este ano) está atualmente avaliado em mais de R$ 4 mil. É o álbum mais caro da música brasileira. Desbanca, em parâmetros monetários (e sonoros: é discutível), o “inatingível” Roberto Carlos. O Rei amarga segundo lugar com Louco por Você, primeiro de sua carreira, avaliado na metade do preço do “excêntrico” Paêbirú.

(Revista Rolling Stone  – O Agreste Psicodélico por Cristiano Bastos)

O disco não precisa de resenha. É daqueles que você precisa colocar sentir. Ouça com calma Trilha de Sumé e entre no disco. Será uma experiência única.

E para entrar no disco, nada melhor que uma cerveja mais encorpada, que fará você viajar profundamente. A Faxe 10% de álcool. Faxe Extra, cerveja Dinamarquesa de cor dourada e com 10% de teor alcoólico. Preferencialmente , tomar na caneca de um litro. Cerveja que conforme você vai bebendo, ela vai adocicando. Portanto, mesmo esquentando ela pode ser degustada. E você não irá se arrepender!

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Pedro Cindio - Jornalista narigudo, músico frustrado e apaixonado por música, tenho um toc de só escutar discos completos. Cervejetariano e feio, mas meu humor salva a aparência.

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