Artigo: Um cabra sabido
Deixei para escrever agora sobre o grande mestre. Quando o escritor cala suas letras, a gente tem que se enlutar e calar as nossas. Fiquei por um tempo em silêncio, lembrando das suas palavras escritas, mas, principalmente, das (bem vividas e por isso) ditas. Ele não falava senão a verdade das suas ações, como também do seu empenho enquanto artista de ver a arte florescer. E, quando ele falava, eu me sentia inflamada (no bom sentido da palavra, claro!). Ficava com vontade de viver mais e melhor e de (quem sabe um dia) falar daquele jeito pra alguém. E isso não é só pretensão, é sonho: falar e fazer as pessoas optarem pela vida através da minha arte. Melhor ainda, se for por uma vida eterna.
Ele não era apenas culto, como tantos assim querem ser. O ‘cabra’ era sabido. E sabedoria, meu bem, é dom divino, seja lá qual for sua crença. Se Ele não quiser, e nem você pedir, você pode ler muito, estudar que ‘só a gota e’, mesmo assim, NÃO VAI TER. Sinto muito! Essa é a lei..
Quantas vezes não passei boa parte do meu domingo, sentada na cama, assistindo as suas aulas-espetáculo. Ouvindo, sorrindo, aprendendo e me inspirando com o paraibano. Eu queria decorar tudo e contar pras pessoas pra fazê-las sorrir, mas, principalmente, pra fazê-las compreender tudo aquilo que o mestre tinha me ensinado sobre a arte. Afinal, dar as minhas opiniões e justificar com algo falado por ele era certeza de ser bem acolhido. Porque não seria pela força, mas pelo riso. E essa é uma das armas mais poderosas que podemos ter pra educar e pra trazer a paz.
Vai, Ariano, vai em paz. Aquela mesma que tu nos trouxe com o riso encantado pela tua fala. Vai ficar mais perto de Deus ainda e, com a Compadecida, interceder por nós pra que a gente aprenda com a simplicidade a ser simples. Que a gente aprenda a não perder a identidade com as influências externas. Que a gente aprenda, não somente, a valorizar o que é da nossa terra, mas a amar e defender. Que a gente aprenda a levar a arte “filé” ** pro povo que se contenta com a arte “osso”. Que a gente aprenda a aprender com os “sem cultura” toda a cultura que jorra da poesia do povo. Que a gente aprenda a ouvir os arianos que moram nas favelas, nos morros, nos sítios e nas ruas. Que a gente aprenda a encontrar a unidade na diversidade de tantos “Brasis” que cabem nesse país. Que a gente APRENDA a ensinar. Mas, pra que isso aconteça, peça ao céu por nós. Pra nos dar sabedoria. Porque de letrados, artistas, doutores e imortais a terra já tá cheia. O mundo precisa é de mais arianos.
** Ao comentar sobre a arte, Suassuna citava o mestre Capiba, grande compositor pernambucano, dizendo que o povo só se contenta com “osso” porque não lhe fizeram experimentar o filé. Ele dizia que essa história que o cachorro gosta de osso é coisa que inventaram: “Bote um filé e bote um osso pra ver o que o cachorro escolhe”, arrancando gargalhadas e fazendo a plateia refletir sobre a responsabilidade pela criação e divulgação do que é bom de verdade.
(O jardim é discípulo de Suassuna nesse sentido: quer dar oportunidade a nós de entrarmos em contato com o filé!)
João Pessoa, 05 de agosto de 2014
(Aniversário da cidade).
Gabriela Maria, orgulhosa que só por ser conterrânea do ‘homi’.
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