Ave Sangria – Ave Sangria 1974
by Pedro Cindio
Acredito que os anos 70 foram os melhores para a música, seja brasileira, americana, europeia ou asiática… bem, não conheço tanto assim, vamos focar no Brasil mesmo.
A banda Ave Sangria é de Pernambuco, tradicional reduto de artistas que souberam mesclar a cultura brasileira com a música experimental. Alceu e Lula Cortês fora os grandes ícones, e tem um dedinho da Ave Sangria nisso.
A banda acompanhou Alceu Valença durante boa parte dos anos 70, e chegou a fazer apresentações com Cortês. Para relembrar algo maravilhoso, veja também este vídeo com o Ave Sangria, Alceu Valença, Moraes Moreira e Lula Cortês cantando “Danado pra Catete”.
O Ave Sangria chocou em seus shows. E esse era o real propósito da banda. Primeiro por conta das letras, que pegavam o amor, o romance, a pieguice e chegava a uma carniceira de um pântano do deus Satã. Passavam mertiolate nos lábios, para dar aparência maltratada.
Transcrevo, agora, uma parte do artigo de Camila Holanda sobre o grupo.
“No primeiro e único disco do grupo formado por Marco Polo, Almir de Oliveira, Ivson Wanderley, Agrício Noya, Israel Semente e Paulo Raphael, vê-se o desatino de jovens inquietos que viviam em um Brasil paradoxal: de um lado, a contracultura, do outro, a ditadura. Ir contra os padrões fazia a cabeça deles. Ave Sangria também foi alvo das censuras do governo militar. A ilustração da capa do único disco da banda foi submetida a modificações, depois, definida pelos integrantes como sendo um papagaio drag queen. Após esse trabalho, feito sob vários problemas, a banda voltaria com o show Perfumes & Baratchos, que acabou servindo como uma despedida da curta carreira. Cinco anos depois, o guitarrista Ivinho seria o primeiro brasileiro a tocar no lendário Festival de jazz de Montreux, na mesma noite em que Gilberto Gil tocaria ao lado de Pepeu Gomes. Acompanhado somente pelo violão de sete cordas, ele improvisou cinco temas na hora que ficaram registrados em disco.”
O disco inicia com “Dois Navegantes”. Não tente entender o disco com a primeira faixa. Geralmente os grupos botam uma faixa mais impactante, porém o disco abre de maneira suave. E via crescendo conforme a atmosfera manda. ‘“Lá Fora “é este mormaço. Lá Fora é…’ Linda canção, com um jogo de vozes lindo. Se tiver oportunidade, ouça sem ser em MP3 com um fone.
“Três Margaridas” eu tenho um carinho especial, pois certa vez em uma reunião de uma fraternidade, tinha uma ruiva tocando essa música em um Ukelele, e o som fala de uma ruiva que morde uma dúvida vermelha entre os dentes… Uma cena de cinema, diga-se de passagem (ou não, as vezes exagero mesmo).
“O Pirata” tem uma estrofe que é a das mais legais. “Minha casa é o reino do mal, o meu pai é um animal, minha mãe há muito que enlouqueceu, só resta eu…” Por favor, como não concordar que isso é uma maluquice genial? E o som é bem mais animado, é a hora que o disco começa a crescer musicalmente.
“Momento na Praça” é a que começa mais lenta e vem com peso após o início, com a psicodelia nordestina em sua raiz. Percussão comendo pesado. E uma guitarra que acompanha com um brilho sensacional. Seguida por “Cidade Grande” que tem o mesmo estilo, início mais lento com a guitarra acompanhando e depois vem o peso.
Mas em “Seu Waldir” é que vem toda a inspiração, sem dúvida a melhor faixa o disco. Um samba rock de dor de corno, cotovelo, um homem que se apaixona por outro homem e joga logo na cara o que pode perder. Veja bem, isso foi em 74…
“Hey Man” é um rasta pé sensacional, com um triângulo bem marcante, conduzindo a primeira parte da música. “Por que” é um samba rock bem maluco. Se é que dá pra denominar esse som.
Porém, chega a hora de fechar com peso. Ao contrário de muitos artistas, que colocam as músicas mais pesadas ou animadas de início e vai decrescendo no disco, o Ave Sangria faz totalmente o oposto. “Corpo em Chamas” já começa com a história de um homem tocando fogo em si mesmo. Mas é o baixo dessa música que a faz tão linda. Ela domina o refrão desde o início. É pesada, tem guitarra bem distorcida e a percussão é muito mais intensa. O que puxa muita bem para a “Georgia a Carniceira”, que jogava boliche com as cabeças das moças mortas de cio…
“Sob o sol de Satã” fecha o disco de maneira instrumental. Nada mais necessário depois de conhecer Geórgia…
Para esta banda tão conservadora, tradicional e repleta de músicas previsíveis, eu só pude escolher uma cerveja da mesma linha.
A Wäls Belgial Quadrupel. Mesmo sendo cerveja de Minas, ela é a mais indicada, pois é forte, alto teor alcoólico com 11%, aparência marrom rubi, espuma densa e duradoura. É de um paladar com amargor equilibrado, de chocolate e toffee. É maturada com chips de carvalho francês previamente embebidos em legítima cachaça mineira, ainda conta com adição de dry-hopping – tradicional técnica inglesa de adição de lúpulo a frio durante a fermentação. O resultado é uma Cerveja de caráter próprio, contemporânea, que mistura influências e sabores de diversas regiões, resultando em uma bebida licorosa.
É isso ae, a vida é pra beber e ficar bêbado, afinal quem não bebe não vê o mundo girar. Assim como acontece com quem não escuta Ave Sangria…
Este texto e cerveja ficam em homenagem ao Ivinho, guitarrista do Ave Sangria e Alceu Valença que faleceu dia 12 de junho por cirrose. Bom, se morreu de cirrose, vai gostar da cerveja que indiquei.
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